sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Trecho do livro "A Bruxa de Portobello" de Paulo Coelho - Texto do Patrono

Trecho do livro "A Bruxa de Portobello" de Paulo Coelho - Texto do Patrono

Academia Virtual de Letras
Patrono: Paulo Coelho
Acadêmico: Mauricio Duarte
Cadeira: 39



Andrea McCain, atriz

Claro que sou culpada. Se não fosse por minha causa, Athena jamais teria chegado ao teatro naquela manhã, juntado o grupo, pedido que todos nós nos deitássemos no chão do palco, e começado um relaxamento completo, que incluía respiração e consciência de cada parte do corpo.
“Relaxem agora as coxas...”
Todos obedecíamos, como se estivéssemos diante de uma deusa, de alguém que sabia mais do que todos nós juntos, embora já tivéssemos feito este tipo de exercício centenas de vezes.  Todos estávamos curiosos do que viria depois de
“...agora relaxe a face, respire fundo”, etc.
Será que acreditava que nos estava ensinando alguma coisa nova? Estávamos esperando uma conferência, uma palestra! Preciso me controlar, voltemos ao passado; relaxamos, e veio aquele silêncio, que nos desnorteou por completo.  Conversando depois com alguns companheiros, todos tivemos a sensação que o exercício tinha acabado; era hora de sentar-se, olhar em volta, mas ninguém fez isso.  Permanecemos deitados, em uma espécie de meditação forçada, por quinze intermináveis minutos.
Então, sua voz se fez de novo ouvir.
- Tiveram tempo de duvidar de mim. Um ou outro demonstrou impaciência.  Mas agora vou pedir apenas uma coisa: quando eu contar até três, levantem-se e sejam diferentes.
“Não digo: seja uma outra pessoa, um animal, uma casa. Evitem fazer tudo que aprenderam nos cursos de dramaturgia – não estou pedindo que sejam atores e demonstrem qualidades.  Estou mandando que deixem de ser humanos, e se transformem em algo que não conhecem.”
Estávamos de olhos fechados, deitados no chão, sem que um pudesse saber como o outro estava reagindo.  Athena jogava com essa incerteza.
- Vou dizer algumas palavras, e vão associar imagens a estes comandos. Lembrem-se que estão intoxicados de conceitos, e se eu dissesse “destino”, talvez começassem a imaginar suas vidas no futuro.  Se eu dissesse “vermelho”, iriam fazer qualquer interpretação psicanalítica.  Não é isso que eu quero.  Eu quero que sejam diferentes, como disse.
Não conseguia sequer explicar direito o que desejava.  Como ninguém reclamou, tive certeza que estavam tentando ser educados, mas, quando acabasse a tal “conferência”, jamais tornariam a convidar Athena.  E ainda iriam me dizer como eu era ingênua por tê-la procurado.” (...)

Paulo Coelho

(Extraído do livro A Bruxa de Portobello . Paulo Coelho .  Coleção Paulo Coelho . página 116 . Gold Editora . Barueri . SP)

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