domingo, 28 de julho de 2019

Livro "Aurora Boreal de Meus Versos" de autoria da minha amiga poetisa e confreira Bartira Mendes Costa, que eu tive o prazer e a honra de escrever o Prefácio

Livro "Aurora Boreal de Meus Versos" de autoria da minha amiga poetisa e confreira Bartira Mendes Costa, que eu tive o prazer e a honra de escrever o Prefácio.
Poesia de alta qualidade que toca o coração de todos em muitas dimensões.




Prefácio

Deus e sonho...
Sonho e Deus...
Representativos são o agradecimento (a Deus) e a dedicatória (aos que não desistiram de seu – próprio – sonho) de uma convicção da autora na simplicidade. Sua poética é fruto de um labor na vida, pela vida e com a vida. Bartira Mendes não se deixa viver sem esperança; nela tudo é “crescimento interior”, é amor que se desprende do estado bruto amoroso e a faz “mergulhar na fé”. Com uma pureza de consciência, no entanto de que “Nesse mundo desencantado / Diluído pela individualidade / E valores distorcidos”, o viver, o viver verdadeiramente, é tão difícil que é necessário considerar a fé como ofício de vida, como ação diária, na qual a religião pode estar presente, mas que o presente, este sim, está sempre sendo experimentado, acima de tudo.
Esta simplicidade se liga diretamente às escolhas das palavras nos seus versos. Não existem, como coloca Domingos Carvalho da Silva em “Uma Teoria do Poema”, palavras poéticas ou antipoéticas. Passam a ser poéticas ou antipoéticas, quase sempre, quase todas, no corpo do poema, no texto do poema. Como diz, L. S. Harris, “grande parte da mais importante poesia inglesa foi inteiramente elaborada com palavras que o povo usa no dia-a-dia da fala comum.” Assim, talvez não seja na nossa língua portuguesa, mais tardia nos ventos da modernidade, ao longo da história, em alguns aspectos... Porém é certo que a erudição pela erudição, ou o rebuscado pelo rebuscado não produzem poesia de qualidade, por si só, de jeito nenhum. Disto sabemos... E Bartira Mendes parece ter este objetivo em mente, o de demonstrar esta questão quando se debruça no seu trabalho poético. Sua poesia poderia ser declamada pelo padeiro da esquina sem muito esforço de memória deste amigo nosso que nos traz o pão quentinho todos os dias. Mas nem por isto faz concessões à qualidade. Pelo contrário. Dir-se-ia que é por este “canto por todos os cantos” – que todos podem cantar – que o seu universo literário canta “As dores e as alegrias / Que o estar viva,/ Já me traz /” e que primam pela qualidade exatamente por causa disto. O viver e o poetizar se mesclam na medida do respirar. Bartira respira poesia... Além disto, a escritora não tenta passar uma tese, ou uma teoria, como poderia sugerir algumas das minhas explanações anteriores. Quando digo que a poetisa tem “o objetivo de demonstrar esta questão”, quero dizer apenas que, do âmago do seu ser, é movida pelo singelo, pela sensibilidade que a leva a espalhá-los a todos, sem exceção. Logicamente, trazer a massa dos indivíduos, dos espectadores, do leitor médio – sem arcabouços literários maiores na sua bagagem de leitura prévia – não é tarefa fácil. A linguagem simples – sintética e não simplória – é uma arma fatal que Bartira usa com maestria.
Maestria essa que não se torna banal, de maneira nenhuma. Antes funda um mito ou um sistema simbólico: “Conversa vai / Conversa vem / De tudo se fala / Do muito se tem, / Conversa vai / Conversa vem / Aceito o desafio / De entre uma palavra e outra / Gritar meus sentimentos / Que mesmo sem rimas / Viram poesias / E de poesia em poesia / Cantam o nosso amor.” Uma simples metáfora pode originar um mito, como diz Max Müller, “a doença mitológica da linguagem”. Mito da imaginação coletivo ressignificado pela poetisa em sua criatividade individual reflexiva. E que mito não é “o cantar do nosso amor”? Como diz Domingos Carvalho da Silva: “Há dois milênios o cordeiro é o mesmo símbolo de Cristo; o teatro não usa máscaras há muitos séculos, mas eles continuam a simbolizá-lo.”
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É certo que a rima não é fenômeno puramente fonético nem puramente ornamento. Tem função de elemento rítmico e estético no poema. Mas os versos brancos e livres, tão praticados no Brasil após a Semana de Arte Moderna de 1922, até 1945, continuaram – e continuam – após isto, tendo sido chamados pós-modernistas, para deleite dos leitores brasileiros e do mundo inteiro. E possibilitam inumeráveis construções em ritmo, que se não obedecem a métrica, obedecem a uma lógica interior própria, onde os versos sem rimas nos levam a um êxtase peculiar de cada peça poética. Assim são os poemas de Bartira Mendes. “Nem ontem / Nem amanhã”, poema representativo no qual está a chave para o entendimento de sua poética, visto que, no hoje, no agora, estamos nós. O momento presente que nos apresenta a verdade: não existem passado e futuro. Um já se foi e o outro não veio ainda. O sentido espiritual desta descoberta é, a um só tempo, “o saborear a vida” e a “coragem de enfrentamento” da vida mesma, cujos frutos nos trarão consciência e discernimento.
Uma “intuição poética natural” conforme diz Greimas, a respeito de uma poética naive que se faz presente em todos, de uma maneira ou de outra, é levada às últimas consequências pela poeta. E mesmo se não considerarmos inteiramente esta tese, sabemos que nos remotos inícios da eternidade dos seres que antecederam toda forma de civilização – e até de humanidade – que hoje conhecemos como tal, os povos (lemurianos e atlantes, quem sabe?) – só se comunicavam em versos ou quase sempre em versos. De modo que há um arcabouço poético em nosso DNA de cada um e de todos. A repetição rítmica e as relações entre a repetição e o significado, estruturam a base de sua poesia, na qual a intuição é mola mestra e o poeta, como queria Yeats, “a voz superior da consciência.”
A função da poética de Bartira Mendes é revelar e acordar, é conscientizar e clarificar, é mostrar e demonstrar, mas, ao mesmo tempo, sua poesia não tem outra função que não a de ser poema, puramente poema, para ser lido e nada mais. Não que seja Torre de Marfim, do poeta recluso em sua poesia pura, mas que tendo consciência de que a militância na poesia política e/ou panfletária de qualquer ordem ou matiz, não configuram qualidade, necessariamente, apenas servem a ditames ideológicos, muitas vezes, sabe do inefável em poesia de modo único. Bartira Mendes, pratica por assim dizer, uma reflexão dos sentimentos, passionalmente lúdicos, em sua grandeza de arte literária.
Deixo o leitor a sós com estes 50 poemas da poetisa Bartira Mendes Costa, escritos sob o signo do agora, do instante no presente, sem mais explicações ou adendos que não se fazem necessários. A poetisa com “Um Gole de Lucidez” apresenta por si própria a sua poesia particular nos versos que detêm, cada um, seu peso estético, sensível e afetivo em medidas generosas. Com a simplicidade de quem sabe onde está pisando.
Deus e sonho...
Sonho e Deus...

São Gonçalo, 25 de novembro de 2018
Mauricio Duarte

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