Um bate papo (entrevista) que o meu amigo Fabio da Silva Barbosa do Reboco Caído fez comigo, enfocando o lançamento do livro Absurdidades . http://rebococaido.tumblr.com/post/109385711280/as-absurdidades-do-mauricio
Suas produções artísticas não nasceram hoje. Conte um pouco sobre o início, as fases, as faces e a trajetória.
Passei a me dedicar em tempo
integral às artes visuais e à literatura a partir de 2007. Mas anterior a isso, durante minha
adolescência eu já tinha participado de um concurso literário de romance no
colégio em que fiquei em segundo lugar.
Depois disso escrevi mais um romance que não gostei do resultado e
joguei fora. Enquanto isso, completei
curso de desenho artístico e publicitário.
Abandonei meus escritos e finalmente entrei na UFRJ para cursar
Programação Visual. Trabalhei durante 9
anos como designer gráfico e ilustrador autônomo depois de formado. Mas não
estava satisfeito. Decidi mudar de
profissão traçando um caminho meio tortuoso.
Comecei fazendo fotografias de “pseudo-ready-mades” como eu chamei, que
depois eram manipulados em computação gráfica, por isso o “pseudo”. Nesse meio tempo já tinha escrito dois contos
infanto-juvenis bastante voltados para uma linha espiritualista e feito o curso
de produção textual com a poeta Maria Regina Moura na editora Canteiros. Pude recomeçar meus escritos numa linha que
ficava entre o libertário e o espiritualista.
Muita coisa aconteceu comigo na vida pessoal e tornei-me neosannyasin a
partir do OSHO concomitantemente a um período longo na militância anarquista no
Rio de Janeiro que depois abandonei. Tudo isso foi muita mudança junta (eu que
fui católico e até hoje ainda me considero assim, seguindo o Tratado de São
Dionísio do OSHO, embora não seja um católico comum). Acredito que essas
transformações refletiram-se positivamente no meu trabalho, porque pude
desenvolver um estilo pessoal na poesia bem voltado para a espiritualidade ou
para a crítica social. No trabalho como
romancista estou finalizando o romance Os arcanos, onde um devoto chamado
Nonato se torna santo em Juazeiro do Norte. Como você pode ver também a
espiritualidade está presente. Nas artes
visuais hoje parti para o expressionismo abstrato, trabalho muito com guache e
nanquim, com cores fortes e tirando proveito, muitas vezes, do acaso na
realização da pintura. Cheguei a essa
fase após muito desenvolvimento em arte figurativa que passou a não me dizer
muito, pelo menos por enquanto.
Explicando
sobre o novo livro você disse: "Absurdos em profusão. 35 reflexões e
histórias curtas sobre o ocaso da existência e a esperança - ou a desesperança
- de um universo em profunda transformação." Fale mais sobre essa ideia.
Acredito que o
mundo está passando por profundas transformações em todas as instâncias, tanto
na política, no social (vemos a Primavera Árabe, vemos os grandes conglomerados
empresariais e especulativos dominando e, ao mesmo tempo, demonstrando toda a
sua incompetência e a falência do sistema mesmo, vemos uma agenda que prevê um
governo mundial que faria a nossa globalização parecer brinquedo de criança)
quanto no mundo intrapsiquico das pessoas.
A Nova Era chegou e trouxe uma série de questionamentos. Todo esse caldo cultural está no
Absurdidades, enfocando, muitas vezes, nos desvalidos, aqueles que a sociedade
esqueceu ou que estão à margem de alguma maneira. São textos curtos e alguns, quase
telegráficos, que originalmente eram poesia, mas que comecei a ver que não
funcionavam assim, por isso adaptei para prosa poética. O resultado me agradou porque não é
cansativo, são 63 páginas que podem ser lidas numa viagem longa de ônibus, por
exemplo.
Como se deu a organização do livro?
Como eu disse,
originalmente os textos eram poesia. Mas
como vi que a maioria deles contava uma história ou era uma reflexão mais do
que partiram de uma elaboração rítmica ou melodiosa de versos, resolvi
adaptá-los para prosa poética, o que me deu a liberdade de acrescentar ou, às
vezes, até diminuir o conteúdo. Escrevi
todos esses textos no meio do ano passado e os adaptei no final do ano passado
e começo do corrente ano. Fiz o design de página imaginando uma fluidez, por
isso utilizei um corpo 12 nos textos corridos e um corpo 14 nos títulos com a
tipologia Cambria. O design de capa leva
a ilustração de um detalhe da minha obra de arte expressionista abstrata Contextura,
realizada com guache e nanquim sobre tela em 2013.
Sua escrita na atual obra:
Posso dizer que
cheguei a uma síntese na minha escrita nesse livro. Dizer só o essencial, só o que não pode
deixar de ser dito. Alguns textos soam
como desabafo em meio ao caos urbano que vivemos e o descaso desse governo – e
de muitos outros na história do Brasil – para com a educação, a cidadania, a
própria dignidade de ser humano de muitas pessoas. Apesar disso, há também muitos textos
divertidos, num sentido irônico e reflexivo, onde tento deixar o desassossego
como legado para o leitor que vai construir a sua própria conclusão do que leu. Espero que meus leitores apreciem o livro
tanto quanto eu apreciei escrevê-lo.
As dificuldades de se trabalhar com arte e
cultura:
As dificuldades são enormes,
sobretudo aqui no Brasil onde a cultura e a arte são vistas em segundo,
terceiro plano. Se você vai tentar
escrever um projeto para pedir apoio financeiro dos órgãos federais, você
esbarra na burocracia e na má vontade, fora a corrupção, que eu não estou nem
citando. Porque para que o seu projeto
seja aceito, tem que ter “quem indica”, tem que ser encaminhado por um produtor
cultural dos bons que tem contatos, que vai cobrar não menos do que R$ 1.000,00
para fazer isso. E está certo. Não está errado. Mas isso já peneirou 99% de muitos projetos
que nem sequer vão ser lidos. As
livrarias pequenas e médias que deveriam ser incentivadas porque tornam a leitura
uma verdadeira aventura e não essas caixas de Harry Potter e não sei quantos
Tons de Cinza das megastores que deixam todo mundo sem opção. Não acho ruim Harry Potter, mas também não
acrescenta nada. Para não dizer que não
fiz nenhum elogio, o governo do Estado do Rio está fazendo um projeto bom de
livros a R$ 2,00 e, no máximo, R$ 3,00 nas livrarias do Poupa Tempo. Mas é um programa limitado e sem muita
divulgação.
Ler
ou não ler Absurdidades?
Olha, o livro é
para quem tem noção de que a nossa realidade está mudando e que absurdos estão
tomando conta da nossa vida constantemente.
Mas se há alguma poesia nisso, ela tem que vir de dentro de cada um de
nós, temos que descobrir o poético em cada não que recebemos da vida ou em cada
tristeza que passam nossos irmãos pedintes e sem-teto nas ruas, por
exemplo. Se há alguma poesia nisso é uma
espécie de poesia maldita. Leia
Absurdidades se você acha que o mundo pode ser um lugar melhor ou mesmo se a
esperança já te abandonou, porque pensar não faz mal a ninguém e o absurdo da
vida é que não querem que nós pensemos, nos querem ignorantes e fáceis de
manipular.