Desenvolvimento e preservação
A abordagem do “problema” meio-ambiente
esteve errada durante muito tempo no passado. Pensávamos em como
subjugar e explorar a natureza para criar desenvolvimento sem destruir.
Porém a verdadeira natureza do homem está de forma intrínseca ligada à
natureza do universo. Daí que não se pode imaginar prosperidade real e
integral sem se considerar que a preservação da natureza e a
sustentabilidade sejam pontos chave desse processo. Exploração,
extrativismo, agropecuária, pesca, indústria, serviços e demais
atividades que o homem exerce devem ser realizadas sob a ordem do
compartilhar com o planeta Terra.
Mas até hoje pouco ou nada foi feito
para que se mude a matriz energética para energia limpa, para deter o
avanço do desmatamento em muitos lugares como a Amazônia ou para
eliminar a poluição das grandes cidades. Nesse contexto, o
desenvolvimento e a preservação são antagônicos? O que tem que ser
entendido de uma vez por todas, é que nós, seres humanos, não possuímos o
planeta Terra. É a Terra que nos possui. Dessa forma, o
“desenvolvimento” ou a “sustentabilidade” só podem existir se ocorrer
comunhão com o universo e com o meio ambiente que nos rodeia. Se dessa
mudança de ponto de vista, decorrer a mudança dessas designações, que
seja. O que não se pode negar é que, como diz o Chefe Seattle em 1855:
“O que fere a terra, fere também os filhos da terra. O homem não tece a
teia da vida; é antes um de seus fios. O que quer que faça a essa
teia, faz a si próprio.”
Na cosmovisão indígena não existe a
ideia de desenvolvimento. No nosso mundo ocidental há uma perspectiva
linear, um processo linear que envolve um estado anterior e posterior,
ditos subdesenvolvimento e desenvolvimento, nos quais o centro é a
ausência ou a presença de acumulação de bens com vistas a um bem estar.
Existe sim, nessas sociedades indígenas, uma visão holística a cerca do
objetivo do esforço humano que é o de buscar condições materiais e
espirituais para alcançar e manter o “bem viver”, a “vida harmônica” que
em idiomas como o quíchua, se define como o “alli káusai”.
Hoje em dia, muitos desses povos
indígenas, no entanto, tem a sua cultura aniquilada lentamente pela
introdução do conceito de desenvolvimento, destruindo a filosofia
própria de ali Káusai. Padrões estruturais da vida social e cultural
das sociedades indígenas são minados, como as bases de recursos de
subsistência e as capacidades de resolução autônoma de necessidades.
O conceito de desenvolvimento, como nós
conhecemos, foi concebido em meados da Segunda Guerra Mundial e colocava
as ex-colônias no grupo de países subdesenvolvidos (terceiro mundo),
classificando as sociedades indígenas destes países como populações
pertencentes à uma realidade tradicional, primitiva e, assim,
considerando-os como grupos da cultura da pobreza ou entre os “mais
pobres entre os pobres”.
Porém a insinuação de que a superação da
pobreza indígena só pode ser alcançada com o acesso aos benefícios da
modernidade é uma falácia. E talvez seja uma ideia falsa não só para os
indígenas como também para nós mesmos. A crise econômica extrema, o
caos social e a destruição ecológica demonstram que o desenvolvimento é
um fracasso.
As sociedades indígenas não devem manter
dentro de uma redoma de cristal sua filosofia de vida. Ao contrário, a
reestruturação de paradigmas dentro dessas comunidades, inclusive
adotando dinâmicas econômicas e adaptando-as à realidade do indígena,
sem sacrificar as bases locais de subsistência e capacidades autônomas
de resolução de necessidades podem ser muito úteis a esses povos.
E nós, como cidadãos da pós-modernidade
urbana e dita desenvolvida ou em desenvolvimento, também não devemos nos
manter aferrados às nossas concepções de desenvolvimento que pouco ou
nada tem feito para contribuir a um bem estar. A utilização e o
fortalecimento da filosofia do “bem viver”, da “vida harmônica” no
ambiente da família e no espaço local, bem como num contexto mais amplo
do governo e das nações, podem nos trazer novos paradigmas alternativos
ao “desenvolvimento” que, talvez, tenha nos levado a mais problemas do
que soluções. Paz e luz.
Mauricio Duarte
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