A Renascença italiana
Nós já vimos
como Aristóteles concordava com Platão no transcendentalismo da sua teologia,
embora ele alcançasse o transcendentalismo por um método inteiramente
diferente. M. Rousselot diz que havia, na realidade, dois Aristóteles na Idade
Média, Aristóteles, o lógico que muito estreitamente escapou de ser canonizado
e, sem o qual, como um cardeal italiano, dissera, “A igreja teria querido
alguns dos artigos de fé”. O outro era o
Aristóteles metafísico, proscrito e perseguido, o autor de toda heresia.
O conhecimento
de Aristóteles veio aos escolásticos através de traduções latinas e por
comentários de Averroes. Que esses
comentários não concordem com o texto é agora geralmente admitido, mas o que
averroismo é, é uma questão tão ampla quanto o que é o aristotelismo. Às vezes, é a muralha da heresia, e, noutras
vezes, o refúgio dos defensores da fé.
Os escolásticos tardios, particularmente Alberto Magnus e Tomás Aquino,
não conheciam maior inimigo da igreja do que Averroes. Os pintores medievais deram-lhe um lugar no
inferno com Mahommed e o Anticristo.
Dante é mais tolerante, tendo colocado o filósofo entre grandes homens,
numa região de paz e melancólico repouso.
Seus trabalhos tinham sido traduzidos para o latim em cerca do final do
século XII ou começo do século XIII e tiveram tantos defensores na Universidade
de Paris que provocaram um exército de oponentes e fizeram vir abaixo a censura
da igreja. Num capítulo anterior nós
classificamos tais hereges como Almaric de Bena, com os Irmãos e Irmãs do
Espírito Livre, como discípulos de João Escoto Erígena. Três séculos intervieram, todos os traços de
genealogia foram perdidos, ainda que similarmente tanto em palavras quanto em
sentimentos façam a classificação razoável. Havia, no entanto, em
funcionamento, um elemento poderoso e vivo e não seria vã inquirição examinar o
quão longe eles poderiam ter sido considerados as crianças de Averroes. É certo que os maiores hereges da Idade Média
foram espalhados a partir dos franciscanos.
Quase todos os grandes movimentos por reforma, por liberdade de
expressão e pensamento, tiveram sua origem no seio dessa ordem. Eles eram os pregadores do “Evangelho
Eterno”, os grandes espíritos que mais se rebelaram contra a Corte de Roma, os
profetas que, não sem uma ponta de entusiasmo, proclamavam a vinda de um reino
espiritual. Agora os líderes da escola
franciscana favoreceram a filosofia de Averroes. “Alexander de Hales” disse, M. Renan, “o
fundador da escola franciscana, foi o primeiro dos escolásticos que aceitaram e
propagaram a influência do filósofo árabe.
João de Rochelle, seu sucessor, seguiu a mesma tradição e adotou, por
sua conta, quase toda a psicologia de Avicenna.
M. Haureau observara justamente que a maioria das proposições condenadas
em Paris por Stephen Templier em 1277 pertenciam à escola franciscana e tinham
sido tomadas emprestadas pelos maiores discípulos de Alexander de Hales, dos
famosos Avicenna e Averroes. No mesmo
ano o dominicano Robert de Kilwardby, arcebispo de Cantebury no concílio que
teve lugar em Oxford, o centro da escola franciscana, condenara proposições
quase idênticas e dizia que a influência de Averroes não poderia ser ignorada. Nós podemos acreditar que alguns dos
filósofos contra os quais, William de Auvergue, Alberto e São Tomás
expressaram-se contra com muita severidade, pertenciam à ordem de São
Francisco.”
Mas a história
do averroismo culmina na Universidade de Pádua.
Ele aparece lá, primeiro como um tipo de crença livre, abraçada
principalmente por físicos e homens devotados aos estudos naturais. Cair em desgraça pela igreja começou a ser
positivo. Isso provocou oposição em
ambos os lados, tanto do lado da filosofia, quanto do lado da teologia
ortodoxa. O averroismo misturou sua
influência com a renascença das letras e depois desapareceu como a estrela da
manhã antes do Sol. Platão voltou à
baila e a escolástica se desvaneceu. O
cardeal Bembo celebrou em verso, o grande evento. A manhã acaba e as sombras vão embora.
Quase todos os
grandes homens da Universidade de Pádua e Florença no tempo da Renascença,
foram chamados de averroistas; mas isso apenas num sentido muito amplo. Eles todos exibiam, de algum modo, a
influência da filosofia em seu contato com a nova direção que tinha sido dada
às ciências físicas. Eles eram todos
também metafísicos ou naturalistas ou uma combinação dos dois.
Livre tradução
do livro Pantheism and Christianity de John Hunt, 1884 . Capítulo IX . A
Renascença Italiana
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