quarta-feira, 2 de novembro de 2016

A Renascença italiana



A Renascença italiana

Nós já vimos como Aristóteles concordava com Platão no transcendentalismo da sua teologia, embora ele alcançasse o transcendentalismo por um método inteiramente diferente. M. Rousselot diz que havia, na realidade, dois Aristóteles na Idade Média, Aristóteles, o lógico que muito estreitamente escapou de ser canonizado e, sem o qual, como um cardeal italiano, dissera, “A igreja teria querido alguns dos artigos de fé”.  O outro era o Aristóteles metafísico, proscrito e perseguido, o autor de toda heresia.
O conhecimento de Aristóteles veio aos escolásticos através de traduções latinas e por comentários de Averroes.  Que esses comentários não concordem com o texto é agora geralmente admitido, mas o que averroismo é, é uma questão tão ampla quanto o que é o aristotelismo.  Às vezes, é a muralha da heresia, e, noutras vezes, o refúgio dos defensores da fé.  Os escolásticos tardios, particularmente Alberto Magnus e Tomás Aquino, não conheciam maior inimigo da igreja do que Averroes.  Os pintores medievais deram-lhe um lugar no inferno com Mahommed e o Anticristo.  Dante é mais tolerante, tendo colocado o filósofo entre grandes homens, numa região de paz e melancólico repouso.  Seus trabalhos tinham sido traduzidos para o latim em cerca do final do século XII ou começo do século XIII e tiveram tantos defensores na Universidade de Paris que provocaram um exército de oponentes e fizeram vir abaixo a censura da igreja.  Num capítulo anterior nós classificamos tais hereges como Almaric de Bena, com os Irmãos e Irmãs do Espírito Livre, como discípulos de João Escoto Erígena.  Três séculos intervieram, todos os traços de genealogia foram perdidos, ainda que similarmente tanto em palavras quanto em sentimentos façam a classificação razoável. Havia, no entanto, em funcionamento, um elemento poderoso e vivo e não seria vã inquirição examinar o quão longe eles poderiam ter sido considerados as crianças de Averroes.  É certo que os maiores hereges da Idade Média foram espalhados a partir dos franciscanos.  Quase todos os grandes movimentos por reforma, por liberdade de expressão e pensamento, tiveram sua origem no seio dessa ordem.  Eles eram os pregadores do “Evangelho Eterno”, os grandes espíritos que mais se rebelaram contra a Corte de Roma, os profetas que, não sem uma ponta de entusiasmo, proclamavam a vinda de um reino espiritual.  Agora os líderes da escola franciscana favoreceram a filosofia de Averroes.  “Alexander de Hales” disse, M. Renan, “o fundador da escola franciscana, foi o primeiro dos escolásticos que aceitaram e propagaram a influência do filósofo árabe.  João de Rochelle, seu sucessor, seguiu a mesma tradição e adotou, por sua conta, quase toda a psicologia de Avicenna.  M. Haureau observara justamente que a maioria das proposições condenadas em Paris por Stephen Templier em 1277 pertenciam à escola franciscana e tinham sido tomadas emprestadas pelos maiores discípulos de Alexander de Hales, dos famosos Avicenna e Averroes.  No mesmo ano o dominicano Robert de Kilwardby, arcebispo de Cantebury no concílio que teve lugar em Oxford, o centro da escola franciscana, condenara proposições quase idênticas e dizia que a influência de Averroes não poderia ser ignorada.  Nós podemos acreditar que alguns dos filósofos contra os quais, William de Auvergue, Alberto e São Tomás expressaram-se contra com muita severidade, pertenciam à ordem de São Francisco.”
Mas a história do averroismo culmina na Universidade de Pádua.  Ele aparece lá, primeiro como um tipo de crença livre, abraçada principalmente por físicos e homens devotados aos estudos naturais.  Cair em desgraça pela igreja começou a ser positivo.  Isso provocou oposição em ambos os lados, tanto do lado da filosofia, quanto do lado da teologia ortodoxa.  O averroismo misturou sua influência com a renascença das letras e depois desapareceu como a estrela da manhã antes do Sol.  Platão voltou à baila e a escolástica se desvaneceu.  O cardeal Bembo celebrou em verso, o grande evento.  A manhã acaba e as sombras vão embora.
Quase todos os grandes homens da Universidade de Pádua e Florença no tempo da Renascença, foram chamados de averroistas; mas isso apenas num sentido muito amplo.  Eles todos exibiam, de algum modo, a influência da filosofia em seu contato com a nova direção que tinha sido dada às ciências físicas.  Eles eram todos também metafísicos ou naturalistas ou uma combinação dos dois.

Livre tradução do livro Pantheism and Christianity de John Hunt, 1884 . Capítulo IX . A Renascença Italiana




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